Sincronicidades e pronoia - Artemísia #27
Um oi diretamente do Peru, atendendo a um chamado que não sei nomear (ainda)
Aterrissei em Lima, capital do Peru, na segunda-feira de manhã, com olheiras suaves porque cochilei de madrugada no chão do aeroporto de Santiago do Chile. Tomei a decisão de vir a terras peruanas e consumar um sonho antigo em abril — meio que repentinamente, mas nem tão do nada assim.
Pedi demissão de dois empregos em seis meses. Escrevi a edição 13 desta newsletter, que você pode ler aqui, sob efeito do segundo salto de fé, me dizendo para ter coragem e sabendo que aquele “sim” gigante estava vindo das entranhas. Segurei na mão da minha Ártemis e do meu Hermes — e cá estou.
Como qualquer chamado que atendemos e não sabemos nomear, as coisas vão dando certo de formas muito esquisitas. Tão esquisitas e inesperadas que se torna impossível não acreditar que há uma ordem no Universo.
Até poucas semanas atrás, eu tinha um ingresso a Machu Picchu e um sonho. Mais nada.
Em Porto Alegre, chamei um Uber para me levar ao ponto de encontro que combinara com a carona de Bláblácar com a qual fui a Florianópolis. Tive que pegar o voo da capital catarinense, uma vez que o principal aeroporto gaúcho segue fechado por conta do dano sofrido nas enchentes (e da cara de pau da Fraport, concessionária do aeroporto).
Entrei no carro desajeitada com o mochilão, vi que o motorista tinha sotaque e perguntei, ingenuamente: “De onde tu é?”.
E ele me deu a única resposta possível: “Peru”.
Achei que meu coração fosse parar.
Estou dormindo na casa de um jornalista peruano, na minha primeira experiência com o Couchsurfing. Ele me apresentou a um grande amigo, que é um fotógrafo premiado (com uma exposição lindíssima sobre mulheres peruanas, inclusive). A caminho do bar, o fotógrafo me perguntou:
“O que você pretende com essa viagem?”
Enumerei o roteiro.
“Não, digo o que você pretende em um nível mais profundo.”
“Foi um chamado”, eu disse, simplesmente.
Ele riu, e o interpelei, fazendo piada: “Não ri, é sério. Foi um chamado.”
E ele respondeu: “Estou rindo porque sei que é sério.” Descobri, depois, entre algumas cervejas e piscos, que ele atendeu a vários desses chamados durante a vida.
Viajar é entrar em portais. Cruzamos com pessoas curiosas, amáveis, que querem genuinamente apreciar outras companhias e aprender. Somos expostos em série ao que Jung denomina de sincronicidades: pequenos acontecimentos aparentemente fortuitos que nos aproximam dos locais, das pessoas e das situações que precisamos rumo ao caminho da Individuação — ou seja, de nos tornarmos cada vez mais nós mesmos.
Quando olhamos para esse todo, percebemos que nada é aleatório e que, ao contrário do que se prega, o Universo é ordem, não caos.
O fotógrafo da história acima, inclusive, me falou de pronoia: a ideia de que tudo conspira a nosso favor o tempo todo. Me perguntou se acredito nisso — e eu respondi que era óbvio.
Tudo é perfeito. Tudo só não é como a gente quer. Repito essa frase como um mantra a cada negativa que recebo — ou, como busco enxergar agora, a cada oportunidade que abre espaço para chegar o que, de fato, é meu.
Gosto muito da palestra abaixo da Lúcia Helena Galvão, em que ela fala sobre símbolos e explana bastante sobre sincronicidades. Deixo abaixo para quem deseja entender mais sobre o tema.
Li esses dias que, para escrever bem, é preciso viver.
Uma pessoa que escreve bem é, portanto, alguém que, antes de tudo, vive. Nessas experiências, observa com cuidado e desvela o que estava encoberto, abrindo possibilidades distintas de leitura da vida, do mundo, da natureza.
Estou vivendo.
Constatação final que merece uma edição à parte: sou muito mais legal em língua portuguesa.
Eu simplesmente amei esse texto! Também vivi uma experiência repleta de sinconidades no Peru e tenho certeza de que o seu texto não chegou até mim por acaso. Quando sentimentos esse chamado de nos aventurar que nem sempre sabemos explicar pela razão, temos que seguir o nosso coração e navegar por essas águas desconhecidas.
No final descobrimos que nem são tão desconhecidas assim.
Acreditmo que viagens não são fugas, mas sim reencontros: com partes da nossa alma que estão nesses portais, com pessoas que temos ligações, com lugares e sensações.
Que a sua experiêcia seja inesquecível!
Já fiquei curiosa pra saber qual linha astrocartográfica você te nas terras andinas!
Boa jornada!
adoro relatos viajantes! um dos maiores prazeres da vida é viajar, conhecer gente nova, outras culturas, outras formas de pensar…