"Eu sentia saudade de mim" - Artemísia #56
Os caminhos de alma pertencem ao passado, não ao futuro
Toda mulher sabe o que quer. Quando coloca Bombril nas antenas da televisão e fica bem quietinha consigo, a resposta grita, pula, joga serpentina. Sintoniza o canal correto.
É óbvio que você sabe, mulher. Não minta para si.
O desafiador é bancar as decisões que emergem, porque implica trilhar rotas que não estão prontas, às vezes nunca foram percorridas por amigas, familiares e conhecidas — e nos resta caminhar um passo após o outro, seguindo as batidas descompassadas do coração. Os pés tremem, a gente se pergunta se não ficou louca mesmo. Depois de tanto esmiuçar as possibilidades de ter ficado tãntã, lelé da cuca, entendi que pensar que você está louca é sinal de lucidez.
E os boletos? E os investimentos? E a carreira aparentemente ascendente? E a casa própria, o marido, os filhos? Tu ainda tá solteira?
Tudo a seu tempo.
Tudo no meu tempo.
Bem quieta, vaporizando com artemísia na noite anterior a dirigir seis horas e meia até Florianópolis, ouço alguém me dizer:
“Você nunca esteve fora do caminho. O que você pensa que era desvio também era o caminho.”
A decisão sempre está tomada. O que você ainda não sabe é como vai levá-la adiante — até que essas perguntas ficam pequenas diante do que se rompe à força. O momento do “sim” fica marcado, não pode ser apagado nem em dolorosas sessões de laser.
Uma mulher que conheço me disse, esta semana, que se inscreveu na faculdade depois dos 45 anos de idade, contra a vontade do marido, e que a decisão se cristalizou em uma segunda-feira às 23h. Outra decidiu largar o marido abusivo, depois de várias tentativas, em um domingo às 16h.
Elas lembram o dia e a hora. Elas lembram da sensação.
No meu primeiro dia em Florianópolis, o destino dos próximos meses, um símbolo se apresentou de forma divertida: o elefante.
Primeiro ele pulou como palavra: é a senha do wi-fi do hostel em que vou morar este mês. Depois se mostrou de forma engraçada: na beira da Praia Mole, tocando instrumentos que eu nunca tinha visto na vida em uma roda com cinco brasileiros, um italiano, um israelense e um alemão, uma paulista que nunca vi na vida se vira para mim e pergunta: “Aquela pedra ali não parece a bunda de um elefante?” Olhando bem, eu vi. E ela respondeu: “Então não tô louca.”
O elefante é um animal que simboliza sabedoria, força, resiliência. É lento pelo seu tamanho imponente, vive muitos anos, sabe onde quer chegar. Vive em um sistema matriarcal, em que as fêmeas desempenham papel de liderança. O animal parece que se esgueira à minha frente, de modo lúdico, para lembrar: “Talvez seja um pouco mais devagar do que você deseja, mas já deu tudo certo — e vai ser leve, divertido e inusitado. Continua.”
Estudando sobre a Vontade, essa chama que brilha dentro da gente e nos impulsiona à ação, o que mais me estalou foi a noção de que nossos reais desejos, aqueles de alma, pertencem ao passado (ensinamento de Francis Paciornik na Escola do Inconsciente). O que você realmente sonha em ser você já é — então, quando trilha aquele caminho, você reencontra uma parte da qual sentia falta, mas que já te habitava.
É um reencontro. Já está tudo feito.
Uma mulher me contou hoje que vive a vida que deseja. Quando se deu conta, ela disse que pensou, de frente para o mar:
“Eu sentia saudade de mim.”
Hora do Chá
Cheguei em Floripa! Fevereiro será de voluntariado em um surf hostel, onde vou ter oportunidade de realizar mais este sonho: estar em cima de uma prancha no mar. Se houver algum leitor ou usuário do Substack pela ilha, me escreva para a gente se encontrar :)
Até semana que vem!
Me arrepiei com a ideia de que o que pensamos ser desvios também são o caminho – que verdade poderosa! Muitas vezes nos questionamos se estamos no lugar certo, se estamos “errando” ao sair do roteiro esperado, mas, no fundo, tudo faz parte da jornada.
O símbolo do elefante apareceu para você como um lembrete perfeito: sabedoria, resiliência, liderança feminina. E adorei essa visão de que nossos desejos de alma pertencem ao passado, como um reencontro consigo mesma. Faz todo sentido!
Que sua temporada em Floripa seja leve, divertida e cheia de boas ondas, dentro e fora do mar!
Meu Deus eu amei essa edição. Linda por completo! Parabéns e obrigada.